Vencedora da Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2024, chega finalmente ao Brasil a comédia dramática (ou dramédia) Anora, do cineasta Sean Baker. Conhecido no meio independente por ter gravado um filme com o iPhone 5s, o diretor demonstra mais uma vez sua habilidade na construção de narrativas envolventes. Embora ainda não seja um nome tão popular como outros vencedores da Palma de Ouro, Baker tem se consolidado como um dos cineastas mais interessantes do cinema independente, especialmente por retratar personagens que são ignorados pela sociedade, como é o caso da dançarina que dá nome a esse filme.
Anora (Mikey Madison), que prefere ser chamada de Ani, é uma dançarina erótica que se envolve com o filho de um bilionário russo após conhecê-lo na boate onde trabalhava. O jovem Ivan (Mark Eydelshteyn), que estava nos Estados Unidos para estudar, propõe que Ani passe alguns dias com ele, vivendo de sexo, drogas e bebedeiras, tudo financiado pelo dinheiro da família. Em uma viagem para Las Vegas, Ivan ainda propõe Ani em casamento, o que acaba causando um conflito familiar, pois os pais de Ivan são famosos e os boatos do casamento ganham repercussão na mídia russa. Esse conflito irá conduzir o enredo, que consegue envolver e divertir os espectadores com muita maestria.
Anora consolida Sean Baker como um cineasta completo e talentoso. O diretor tem se destacado por entregar histórias autorais que retratam grupos marginalizados, desprestigiados ou excluídos socialmente, como profissionais do sexo e imigrantes. Suas habilidades como roteirista, diretor e editor podem ser vistas em obras anteriores como Tangerina (2015), Projeto Flórida (2017) e Red Rocket (2021). Todas elas apresentam dramas de indivíduos que foram excluídos do famoso sonho americano.
Em Anora, Baker mantém sua câmera voltada para os excluídos, mas intensifica esse drama ao contrastar com a realidade de alguém que gasta todo o dinheiro possível sem se preocupar com as consequências desse desperdício.Apesar disso, em nenhum momento o filme se torna piegas ou melancólico. Pelo contrário, Baker consegue explorar asfantasias americanas com muito bom humor, chegando a arrancar gargalhadas do público por meio de situações absurdas que ocorrem naturalmente.
É interessante observar como a relação construída entre Ani e Ivan parece autêntica, apesar de ser baseada em interesses mútuos. Ivan, claro, está interessado nos serviços sexuais de Ani, enquanto ela está deslumbrada com toda sua riqueza. Por outro lado, Ivan aparenta nutrir certa afeição por Ani, o que a faz ter esperança de que os estigmas associados à sua profissão serão superados. Contribui bastante para essa dinâmica dar certo a atuação de Mikey Madison, que incorpora muito bem seu papel e consegue entregar todas as sutilezas exigidas pela sua personagem.
Anora, portanto, tem potencial para agradar públicos mais amplos que os filmes anteriores de Baker e torná-lo mais conhecido. Não seria exagero afirmar também que ele está entre os melhores filmes de 2024. Com uma narrativa envolvente, humor afiado e um olhar sensível para questões sociais, Sean Baker mais uma vez prova seu talento como um dos cineastas mais relevantes e habilidosos da atualidade.
Nota:5/5
Por: Samuel Holanda